Nos velhos tempos, quando engenheiros espaciais faziam o mapa de um planeta ou uma lua distante, criavam uma imagem 8×10 de parte da superfície, identificavam dois pontos de referência – uma cratera e alguma protuberância, por exemplo – e mediam a distância entre eles com régua e caneta.
“Então inseríamos o número no computador e calculávamos a latitude e a longitude,” lembrou Robert W. Gaskell, especialista em mapeamento planetário. O resultado era bidimensional, apenas com pistas a respeito da textura ou complexidade da superfície.
Não mais. Com computadores modernos, fotografias digitais e rastreamentos a laser, os cientistas hoje fazem um trabalho bem melhor identificando locais a partir de suas espaçonaves, escolhendo áreas de pouso e também descrevendo a paisagem extraterrestre do sistema solar.
E ninguém faz isso melhor que Gaskell. Com o software que ele desenvolveu em um quarto de século de tentativa e erro, ele pode processar centenas de imagens em poucas horas, colocá-las uma sobre a outra eletronicamente, como camadas de tinta, e produzir um mapa topográfico tão detalhado que às vezes você precisa de um par de óculos 3D para apreciar o que ele fez. Aos 63 anos, Gaskell é hoje um explorador espacial.
Ele se aposentou do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa em 2006 para se dedicar ao mapeamento em tempo integral e agora trabalha em um escritório repleto de computadores em sua casa no subúrbio de Los Angeles. Ele é membro do Instituto de Ciências Planetárias, em Tucson, Arizona, mas recebe seus próprios subsídios e pode ser descrito como um freelancer.
No momento, Gaskell mapeia Mercúrio e oito luas de Saturno. Ele também tem um contrato com a Nasa para realizar parte do mapa topográfico da Lua terrestre e está trabalhando em um projeto para refinar seu modelo do asteróide próximo à Terra, Eros. Ele fez 12 mil “maplets” sobrepostos de Eros a partir de imagens produzidas pela espaçonave NEAR captadas na virada do século. Ao todo, a NEAR criou 160 mil imagens digitais e “estou processando mil por vez,” disse Gaskell.
Gaskel chama o que faz de “estereofotoclinometria.” Idealmente ele precisa de pelo menos três imagens de uma paisagem alvo, normalmente tiradas de uma espaçonave orbitando ou uma sonda de passagem rumo a outro destino. Apenas em casos raros as imagens de telescópio conseguem um nível de detalhamento suficiente.
O ângulo do Sol precisa estar diferente em cada quadro, para que cada imagem tenha sombras distintas. Comparando as sombras, o software calcula declives, que revelam as altitudes das características do alvo. O computador soluciona a equação em três dimensões, produzindo um maplet de uma porção da topografia da área.
O objetivo é criar um modelo 3D do corpo inteiro. Uma primeira tomada pode ser feita rapidamente, mas quanto mais imagens e maplets, mais sobreposições são produzidas, aperfeiçoando a topografia até as imagens dos cientistas acabarem. Gaskell começou a trabalhar no Eros em 2002.
Formado pela Universidade McGill e com um Ph.D. em Física, Gaskell iniciou sua carreira no mapeamento celestial em 1984, mas foi em 1989 que ele começou a visualizar as possibilidades, usando imagens da sonda Voyager para estudar a lua vulcânica Io, de Júpiter. Ele construiu seu mapa comparando o brilho de um detalhe em diferentes imagens. Seus computadores não eram capazes de prestar atenção aos ângulos solares, mas, disse, “eu intuitivamente sabia que iluminações diferentes poderiam gerar mais informações.”
Sua primeira grande idéia veio em 1995, enquanto utilizava imagens da Viking, da Nasa, para mapear possíveis áreas de pouso em Marte. As imagens foram tiradas com uma diversidade de ângulos solares, e Gaskell entendeu “em cerca de um milissegundo” que com o poder computacional que detinha, ele poderia calcular diferenças de níveis e, assim, construir topografias.
Ele refinou sua técnica e em 2000 a utilizou para mapear Phobos, a maior lua marciana, de forma que um pouso em Marte pudesse usar o mapa como ajuda navegacional. “Tinha talvez cem maplets,” disse Gaskell. “Então pensei, por que não fazer da lua inteira? Eu poderia selecionar outros pontos próximos e sobrepor os maplets. Não seria muito mais difícil.”
E assim ele fez. Phobos, como se revelou, parece uma batata opaca, alongada e cheia de crateras. O primeiro modelo topográfico de Gaskell usou 146 maplets.
Eros veio a seguir e até agora tem 12 mil maplets. Em seu último emprego no laboratório de propulsão, em 2005, Gaskel recebeu auxílio da Agência de Exploração Aeroespacial do Japão para construir um modelo topográfico do asteróide Itokawa, outro objeto próximo à Terra com cerca de 500 metros de comprimento, com imagens da espaçonave Hayabusa.
Gaskell agora trabalha em Mercúrio, um projeto que ainda não avançou muito. A sonda Mariner 10 fez três passagens em 1974-75, mas o ângulo solar era o mesmo em todas as imagens, com pouca variação de exposição. A espaçonave Messenger fez duas passagens, fornecendo muito material novo, mas poucas sobreposições. Entretanto, depois que a espaçonave se estabelecer na órbita de Mercúrio em 2011, Gaskell terá todas as imagens que quiser.
Ele reconhece sem restrições que tem mais trabalho do que consegue lidar e, longe de ter ciúmes do procedimento, deseja muito ensinar a outros sua técnica. Nesse ponto, o software de Gaskell pode integrar todos os tipos de informação e fazer parecer fácil. Ele pode usar imagens em alta ou baixa resolução, leituras a laser e mesmo de radares de rádio-telescópios (para Itokawa).
“Sua abordagem é única,” disse o geofísico Olivier Barnouin-Jha, do Laboratório da Física Aplicada da Universidade John Hopkins, um colaborador de Gaskell nos projetos Eros, Itokawa e Mercúrio. “Mas não vem tudo pronto como numa caixa preta. Existe muito trabalho manual e agonia no processo.”
Tradução: Amy Traduções
Guy Gugliotta
The New York Times