Oliver Selfridge, um inovador nos primórdios da ciência da computação e da inteligência artificial, morreu nesta quarta-feira em Boston aos 82 anos. A causa foram os ferimentos deixados por uma queda sofrida no domingo em sua casa em Belmont, Massachusetts, informou sua companheira Edwina Rissland.
Creditado como criador do termo “agentes inteligentes” para os programas de software capazes de observar e responder a mudanças em seu ambiente, Selfridge teorizou também sobre muitas outras coisas, entre as quais aparelhos que não só automatizariam certas tarefas mas também aprenderiam com a prática a executá-las de maneira melhor, mais rápida e mais barata.
Em sua opinião, chegaria o dia em que as máquinas seriam capazes de analisar as instruções de seus operadores para discernir não só aquilo que os usuários solicitassem mas também aquilo que eles realmente desejavam como resultado, o que nem sempre é a mesma coisa.
Em 1958, ele publicou um estudo chamado Pandemônio: Um Paradigma de Conhecimento, no qual propunha uma coleção de pequenos componentes, conhecidos como “demônios”, que juntos permitiriam que máquinas reconhecessem padrões. O estudo se tornou um marco histórico para a ciência do aprendizado mecânico, que então começava a emergir.
Entusiasta precoce quanto ao potencial da computação interativa, Selfridge teve suas idéias sumarizadas em um estudo publicado em 1986 por J. C. R. Lickider e Robert Taylor, sob o título O Computador como Dispositivo de Comunicações.
Para homenagear Selfridge, os autores propuseram um dispositivo conhecido como OLIVER, acrônimo em inglês para “expedidor e respondedor vicário interativo online”. O OLIVER representa uma das primeiras descrições claras quanto a um organizador pessoal eletrônico.
Com quatro outros colegas, Selfridge ajudou a organizar uma conferência no Dartmouth College, em 1956, que conduziu diretamente à criação da inteligência artificial como campo de estudos.
“Oliver foi um dos pais fundadores da disciplina da inteligência artificial”, disse Eric Horvitz, pesquisador da Microsoft e presidente da Associação para o Progresso da Inteligência Artificial. “Ele era conhecido nesse campo por seus trabalhos precoces e prescientes quanto aos desafios que seria preciso superar para dotar as máquinas da capacidade de aprender a reconhecer padrões”.
Oliver Gordon Selfridge, neto de H. Gordon Selfridge, o norte-americano que fundou a famosa loja de departamentos Selfridges em Londres, nasceu em Londres em 10 maio de 1926. Sua família perdeu o controle dos negócios do avô durante a Grande Depressão e emigrou para os Estados Unidos no começo da Segunda Guerra Mundial.
Ele estudou na Middlesex School, em Concord, Massachusetts, e no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), onde se formou em matemática aos 19 anos. Depois de servir na Marinha, iniciou estudos de pós-graduação no MIT sob a orientação de Norbert Weiner, pioneiro da teoria da computação. Tornou-se um dos colaboradores de Weiner mas mergulhou no mundo profissional da computação antes de obter um diploma avançado.
Nos anos 60, ele foi diretor associado do Projeto MAC, um dos primeiros projetos de computação compartilhada do MIT. Realizou boa parte de seus trabalhos para o Laboratório Lincoln, do MIT, um centro de pesquisa financiado pelo governo federal que desenvolve tecnologia de segurança. Depois trabalhou para a Bolt, Beranek & Newman, hoje BBN Technologies, que desenvolve tecnologia de computação e telecomunicações. Em 1983, se tornou vice-presidente científico do grupo de telecomunicações GTE.
Selfridge começou a assessorar os líderes do país em questões de segurança nacional ainda nos anos 50; entre outros postos, foi membro do Comitê Consultivo de Inteligência Estrangeira da presidência e do Conselho Consultivo de Ciência da Agência Nacional de Segurança (NSA).
Seu primeiro casamento, com Allison Gilman Selfridge, e o segundo, com Katherine Bull Selfridge, terminaram em divórcio. Além da companheira, ele deixa a filha Olivia Selfridge Rissland, três filhos do primeiro casamento Peter Selfridge, Mallory Selfridge e Caroline Selfridge, a irmã Jennifer Selfridge MacLeod e seis netos.
Além dos estudos acadêmicos e livros técnicos que escreveu, Selfridge também foi autor dos livros infantis Fingers Come in Fives, All About Mud e Trouble With Dragons. Nos meses que antecederam à sua morte, vinha trabalhando em uma série de livros que esperava um dia se tornassem o equivalente aritmético dos livros de leitura de férias usados pelos alunos de escolas dos Estados Unidos.
Selfridge nunca deixou de lado seu trabalho teórico, suas palestras e seus ensaios quanto à visão que tinha para o futuro da inteligência artificial. “Quero desenvolver um agente capaz de aprender e de se adaptar como eu mesmo faria”, ele declarou certa vez em um evento de estudos promovido pela IBM.
Um agente como esse “inferiria o que eu desejaria que fizesse, com base nos propósitos sempre atualizados sobre os quais teria aprendido enquanto trabalhasse para mim”. Com isso, acrescentou “ele faria o que realmente quero e não as bobagens que eu possa ordenar que faça sem saber”.
Tradução: Paulo Migliacci ME
The New York Times
John Markoff